Numa folha bastarda de um livro de Borges, descubro a
figura austera de uma Enciclopédia
Universal dos Periódicos Mortos. Folheio avidamente o volume relativo à
letra jota — e deparo-me, sem surpresa, com um certo verbete irreverente:
«Jornal dos
Arcos» — Título vila-condense, de alcance escolar, cujo ciclo vital irrompeu em
janeiro de dois mil e cinco e veio a desaguar, sem mágoa, em junho de dois mil
e treze. No decurso dos seus oito anos de existência, floriram dezassete
edições (correspondentes a um total de duzentas e setenta e duas páginas
impressas a preto e branco). Com periodicidade bianual e uma tiragem média de
quatrocentos exemplares, tornou-se rapidamente a janela aberta e a «imagem de
marca» da Escola Secundária D. Afonso Sanches. Sob a direção de Eurico de
Carvalho, desenvolveu-se um meritório trabalho de equipa, para o qual
contribuíram, em particular, o notável rigor editorial de Manuel Fontão e a
exigente imaginação gráfica de Alberto Oliveira e Rui Santos. Passaram a ser
parte, portanto, não sendo cega a musa da História, do áureo friso de uma
monografia vindoura.
É verdade, então, que os jornais também morrem. Em toda a minha vida, que
vai a caminho do meio século, soçobraram à fúria do capital e do tempo inúmeros
títulos. É por ser demasiadamente longo o necrológio que posso citar alguns de
memória: «O Comércio do Porto», a «Gazeta dos Desportos», o «Diário de Lisboa»,
o «Diário Popular», o «Independente», o «Tempo», «A Capital» e, acima de todos,
«O Jornal». Mas se era a sua leitura, para mim, um ritual hebdomadário, isso
apenas se devia a um senhor que escrevia
na água e se chamava Abelaira. Simplesmente imperdível!
Do mesmo modo, imagino agora o leitor ideal do «Jornal dos Arcos», i.e., antecipando com volúpia o prazer
de ler, por exemplo, os artigos acerca do nosso patrono da autoria de Fernando
Nabais. Imagino-o igualmente a tentar adivinhar os temas de capa. E foram
tantos! De resto, não será de mais lembrá-los: «D.
Afonso Sanches — o Trovador e o Aristocrata», «Globalização — o Nosso Mundo é uma Aldeia», «Blogosfera», «O Futuro da Democracia», «O
Centenário da República», «Escritores
de Vila do Conde», «Sexualidades
& Toxicodependências», «E se fosses
uma Personagem de Banda Desenhada?», «Heróis
do Nosso Tempo», «Estaremos Sós no
Universo?», «O Futuro da Europa»,
«Onde está a Felicidade?» e,
inevitavelmente, «A Crise». Desta
lista (incompleta, aliás), há que realçar a diversidade temática. Com tal
riqueza de conteúdo, de facto, quisemos garantir, à partida, a ressurreição
instrumental de cada número, ou seja, a sua imediata posteridade. Por que via?
Através de uma reutilização inteligente em plena sala de aula. Realmente,
enquanto fonte documental, o «Jornal dos Arcos», pese embora a sua certidão de
óbito, não morreu e, assim o queiram os leitores, nunca há de morrer.
A esta distância, já de meses vários, urge dizer a boa sensação de um
dever que se cumpriu. Com efeito, foram inteiramente satisfeitos os objetivos
que presidiram à fundação do «Jornal dos Arcos»: (i) promover a imagem da Escola junto do meio envolvente; (ii) estimular a criatividade discente; (iii) iniciar os alunos nas técnicas de
redação jornalística; (iv) contribuir
para o debate interno de ideias; (v)
divulgar as atividades e iniciativas escolares; (vi) cultivar o gosto pela escrita e pela leitura; (vii) reforçar o sentido de pertença à
comunidade educativa; e (viii)
promover o uso das novas tecnologias de informação e comunicação. Como se
depreende facilmente deste elenco estratégico, o «Jornal dos Arcos» sempre quis
ser, acima de tudo, um jornal dos alunos e para os alunos. Não podia deixar de
ter, por isso mesmo, a marca do seu engenho criativo. E assim aconteceu, de uma
forma emblemática, com a escolha do título
do próprio jornal e com a definição do grafismo do seu cabeçalho. Apesar da
inexistência curricular de um Curso de Artes, tivemos a felicidade de apostar
na matéria‑prima da casa. E ganhámos a aposta! Só me resta desejar, por
conseguinte, a quem nos sucede nesta nobre tarefa de contar a vida de uma
escola, a mesma aposta e uma fortuna ainda maior do que a nossa!
Eurico de Carvalho
In «Impressões», n.º 1 do jornal do Agrupamento de Escolas D. Afonso Sanches. Dezembro de 2013 (p. 2).